Montante representaria um aumento de cerca de 40% na arrecadação do IRPF
Uma proposta do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) sugere a implementação de um imposto global mínimo de 14% sobre a renda dos brasileiros mais ricos — aqueles que ganham acima de R$ 50 mil por mês.
A medida tem potencial para adicionar até R$ 145,6 bilhões por ano aos cofres públicos, o que representaria um aumento de cerca de 40% na arrecadação do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF).
Defendida em Carta de Conjuntura recém-publicada pelo Ipea, a proposta atingiria os 2% de contribuintes com maior renda no país. O objetivo é corrigir a regressividade do sistema tributário atual, onde os mais ricos pagam, proporcionalmente, menos impostos do que aqueles com rendimentos médios.
A alíquota de 14% proposta refere-se à chamada Tributação Efetiva Global da Renda (TEGR), que considera tanto o IRPF quanto as contribuições previdenciárias.
Segundo o autor do estudo, o técnico de planejamento e pesquisa Pedro Humberto Carvalho, esse percentual é o máximo atualmente pago por grupos com renda mensal em torno de R$ 16 mil. No entanto, para os super-ricos, a carga tributária começa a cair, devido a isenções como as de dividendos, reembolsos e prêmios.
Ipea: arrecadação do IRPF chegaria a 4,3% do PIB
Com a medida, a arrecadação do IRPF passaria de 3,1% para 4,3% do PIB (Produto Interno Bruto), aproximando-se de países como Polônia, Uruguai e Eslováquia, ainda que abaixo da média de 8,5% observada em economias avançadas da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
A proposta do Ipea é mais abrangente que o Projeto de Lei nº 1.087/2025, atualmente em discussão no Congresso. Além de prever uma alíquota mínima de 14% sobre a renda total dos mais ricos, o estudo sugere a tributação na fonte de 15% de todos os dividendos, o que corrigiria desigualdades entre contribuintes com a mesma renda, mas de origens diferentes — trabalho versus capital.
Outro diferencial é que a base de cálculo incluiria todas as fontes de rendimento, sem brechas significativas, o que evitaria a migração para ativos isentos. “O imposto mínimo só seria aplicado para aqueles contribuintes com renda superior a R$ 50 mil mensais e que tivessem tributação efetiva inferior a 14%”, explica Carvalho.
O estudo também sugere ajustes à proposta do governo para evitar distorções, como o incentivo à criação de múltiplas empresas para escapar da tributação de dividendos. O Ipea propõe que o limite de isenção de R$ 50 mil mensais seja aplicado de forma agregada entre todas as empresas do contribuinte.
Riscos e estratégias de mitigação
Entre os riscos apontados está a possível evasão fiscal por mudança de domicílio. Para mitigar o problema, o estudo recomenda que a Receita Federal tenha acesso a acordos internacionais de troca de informações e a adoção de um “imposto de saída”, como fazem 14 países da OCDE. Outra alternativa seria manter obrigações tributárias por até cinco anos após a mudança de domicílio para países com regimes favoráveis a milionários.
O estudo também analisa o risco de sobrecarga tributária sobre o lucro empresarial, mas ressalta que, apesar das altas alíquotas nominais, a carga efetiva no Brasil é comparável à média internacional.
Outro ponto crítico são os investimentos isentos, como fundos imobiliários e fundos de cadeias agroindustriais, que hoje escapam da tributação. O Ipea propõe mudanças em regras para fundos de pensão, como o aumento do prazo mínimo para alíquota regressiva de 10% e limitação das deduções a contribuintes com renda de até R$ 600 mil por ano.
A proposta ainda sugere limitar deduções médicas, que beneficiam desproporcionalmente os mais ricos. Em 2024, elas representaram um gasto tributário de R$ 26,7 bilhões. O estudo propõe a criação de um crédito tributário fixo para todos os contribuintes, com deduções restritas, mas abrangendo também medicamentos — especialmente úteis para usuários do SUS.
Por fim, o estudo aborda a disparidade na tributação de aluguéis, apontando que holdings imobiliárias pagam menos imposto que pessoas físicas. Como solução, propõe-se unificar a tributação em 15%, permitindo deduções cruzadas entre aluguéis pagos e recebidos, além dos juros de hipotecas.
Arquivo: Rafa Dotti/ Brasil de Fato